IX DOMINGO DO TEMPO COMUM
A liturgia deste IX Domingo do Tempo Comum convida-nos a refletir sobre a celebração do Dia do Senhor, “sábado para os judeus,” “domingo para os cristãos,” fazendo memória da ação criadora e redentora de Deus para o seu povo.
Ela quer nos fazer compreender que o valor do sábado para os judeus tem o mesmo peso do domingo para os cristãos, enquanto um faz memória do repouso do Senhor depois da obra da criação e da libertação do Egito, o outro celebra o Dia do Senhor, tendo como fundamento os acontecimentos que marcam a história da salvação.
Jesus é enviado pelo Pai para colocar em prática todo um projeto de libertação. Ele ensina, Ele cura, Ele forma discípulos, depois é julgado pelo poder político e religioso, condenado injustamente, morre na cruz e no terceiro dia, em um domingo primeiro da semana, Ele ressuscita, vencendo assim a morte, um inimigo feroz e destruidor. Por isso, nós cristãos guardamos o domingo como um dia de festa e de preceito, atualizando a ação libertadora de Deus quando voltou-se para o povo escravizado no Egito. Com isso, acredito que poderemos caminhar juntos respeitando a liberdade de cada um, “tudo é graça”.
A Primeira Leitura (Dt 5,12-15) recorda-nos o preceito do terceiro mandamento: guardar o sábado para o santificar, sugerindo que seja um dia que exprime a unidade do povo que celebra a ação libertadora de Deus, sem quaisquer tipo de desigualdades.
Deuteronômio, ao contrário de Êxodo, associa o terceiro mandamento a ação criadora de Deus, com o descanso no sétimo dia da semana (sábado), faz referência ao trabalho escravo de um povo que foi explorado no Egito por um longo período de tempo: “Tu te lembrarás de que, na terra do Egito, “eras escravo” e que o SENHOR, teu Deus, te fez sair de lá com mão forte e braço estendido. Eis por que o SENHOR, teu Deus, te ordenou guardar o dia de sábado” (Dt 5,15). Portanto, a versão ‘deuteronomista’ do terceiro mandamento nasce da experiência de quem já foi escravo e aprendeu que na liberdade conquistada a duras penas provocam surgimento de um código de ética diferente ao que vigoraram em tempo do cativeiro, em que o povo é submetido à força do sistema opressor, que quando em vigor exploram uma mão de obra barata.
Na visão do Deuteronômio, o sábado é um dia em que se comemora a libertação. Nesse dia toda a criação participa da festa suscitada pela liberdade e pela posse da terra. De fato, o que refletimos hoje, prevê o descaso também para empregados (escravos), estrangeiros, aos animais e inclusive por extensão ao próprio solo de onde o homem tira seu sustento (Dt 5, 14). Este versículo finaliza mostrando-nos que os dons devem ser repartidos na igualdade de direitos “a fim de que teu servo e tua serva repousem como tu”.
É, nesta perspectiva “deuteronista”, que o sábado tinha implicações sociais importante que apontam para uma relação social igualitária. Isso nos faz refletir no povo que não goza deste direito, é obrigado a fazer bicos para defender o sustento de sua casa, um exemplo entre tantos são as empregadas domésticas, pois nem sempre tem seu dia de descanso, e quando o tem, são obrigadas a tocar o serviço acumulado em sua própria casa. Com o passar do tempo o sábado em vez de ser um dia de festa, passou a ser um fardo pesado na vida das pessoas. É deste jugo que Jesus vem libertar o povo de Deus.
O Evangelho segundo Marcos (2,23-3,6) é claro em chamar-nos a atenção para interpretação da lei de forma legalista sem olhar para o que é mais precioso para Deus na pessoa de Jesus Crista “a vida”. Os preceitos da lei deixam de cumprir sua missão se não estiver a serviço do homem dentro de cada tempo. Com isso, Jesus convida-nos a posicionar-nos a favor dos necessitados, tendo conta que o dia do Senhor foi feito para o homem e não para fazer do homem um escravo (Mc 2,27). É um convite a vivermos não do preceito, mas na Lei do amor, um amor que liberta, um amor que cuida, um amor que protege e que está impresso no nosso coração, através do novo mandamento: “Um mandamento novo eu vos dou, amai-vos uns aos outros. Como eu vos amei...” (Jo 13,34).
Está em nossa frente a ação de Jesus, quando Ele nos ensina sobre as práticas que fazem a opção clara pela vida, e o que nos salta os olhos é que Ele usa como referência a antiga lei, primeiro quando ele permite que seus discípulos colham trigo em um dia de sábado, o que não era permitido pelos Judeus na aplicação radical da lei: “Então nunca leste o que fez David quando ele e seus companheiros se acharam em necessidade e ele sentiu fome, como no tempo do sumo sacerdote Abiatar, ele entrou na casa de Deus, comeu os pães de preposição, que ninguém é permitido comer, senão os sacerdotes e deu também aos que estavam com ele?” (Mt 2,25). Ele confirma sua autoridade e seu poder no serviço a vida quando nos diz que Ele é o Senhor do Sábado, conforme lemos: “de sorte que o Filho do homem é o Senhor até do sábado” (Mt 2,28).
Os Judeus que cercavam Jesus para matá-lo, ficava sem repostas quando Ele os desafiava curando em um sábado. Este desafio de Jesus era para mostrar que a lei deverá estar à serviço da vida, como encontramos na passagem em que Ele cura o homem da mão seca em um sábado, chama-o ao centro e pergunta: “... Que é permitido no dia de sábado, fazer o bem ou fazer o mal? salvar uma vida ou mata-lo” (conf. Mt 3,4). O silêncio daqueles que estavam ao redor de Jesus foi perturbador, indicando um sinal de neutralidade diante daquela cena. Marcos diz que Jesus olhou ao redor, isto é, olhou para todos e se encheu de tristeza, pelo endurecimento do coração do homem (Mc 3,5).
A esclerose do legalismo sabático havia tomado conta do coração do homem (Mc 3,5). Hoje, acontece a mesma coisa, diante do sofrimento do povo, poucos possuem aquele germe de ira e tristeza presente no coração de Jesus. O jugo do desemprego, dos altos custos da cesta básica, que o salário mínimo não cobre, da elitização da saúde que provoca grandes filas para uma simples consulta médica, da educação, do trabalho escravo, levando o povo a miséria que o impede de viver.
O resultado disso tudo, assim como os Judeus que rodeavam Jesus neste episódio e em muitos, nosso coração estar doente, incluindo os corações esclerosados de algumas lideranças religiosas, para os quais o povo e suas necessidades são apenas um apêndice em suas preocupações.
Que o nosso coração seja transformado a ponto de sentir o coração de Jesus que se entristeceu com a atitude dos Judeus, mas que não se deixou abalar com a indiferença do silêncio, curando o homem em um sábado, mostrando assim, seu senhorio, seu poder e sua misericórdia acompanhada da justiça: “Mas eles ficavam calados, passando sobre eles um olhar de cólera, entristecido pelo endurecimento de seus corações, disse ao homem: “Estende a mão”. Ele estendeu a mão e ficou em perfeitas condições” (conf. Mt 3, 4-5).
Diácono Artur Carlos Pereira
Referência:
Bíblia tradução Bíblia de Jerusalém
https://www.dehonianos.org
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