Dízimo: baluarte da fé e consciência do amor



Define-se “reciprocidade”, a partir de uma análise dialética, como a presença de uma correspondência mútua entre sujeitos. Sob esta visão, a reciprocidade fundamenta-se como base para a existência de uma relação e, sobretudo, como requisito para que haja compreensão entre aqueles que se relacionam. O entendimento deste conceito é necessário para a gnose da relação existente entre Criador e criação e entre as próprias criaturas. Como expressa o livro dos Atos dos Apóstolos, a comunidade daqueles que creram era “um só corpo e uma alma” (cf. At 4, 32) e “tinha tudo em comum, dividindo o produto dos bens entre todos, segundo a necessidade de cada um” (cf. At 2, 44). Desde o nascimento da Igreja Primitiva, no berço da cruz, até seus dias atuais, o espírito de partilha guia o coração dos fiéis para retribuir ao Senhor não por obrigação meramente moral ou com o objetivo de estabelecer com Deus uma relação cambista ou de interesses, mas pela consciência cristã de um amor recíproco. 

Dessa maneira, o dízimo configura-se como expressão de nossa fidelidade a um Deus que nos é constantemente fiel. Portanto, ser dizimista é colaborar com o plano de amor de Deus para a salvação da humanidade e, além disso, integrar este plano. As quatro dimensões do dízimo: religiosa, eclesial, missionária e caritativa, expressam a dinâmica cristã para com a transformação social, a evangelização integral e a necessidade de ser e fazer Igreja. Etimologicamente, o dízimo refere-se à décima parte de tudo aquilo que se recebe e constitui um dos cinco preceitos da igreja (CDC, cân. 222), por meio da qual a igreja garante sua sustentação física, enquanto templo e comunidade com necessidades básicas inserida em uma sociedade civil organizada. No entanto, o dízimo transcende a concepção material quando põe sobre os fiéis a responsabilidade de ser suporte às necessidades físicas e espirituais da igreja e à evangelização, contrapondo o pensamento, fruto de uma mentalidade meramente humana, que acredita ser esta responsabilidade do clero, em seus bispos e sacerdotes.

Ainda, uma das maiores dificuldades encontradas na caminhada é dissociar o dízimo do significado monetário, implantando-o na vida dos cristãos segundo o seu sentido comunitário: “Deus ama quem dá com alegria” (cf. 2Cor 9. 7). É orientado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil que se evite o sentido de taxa ou mensalidade e a ideia de retribuição, segundo a qual é preciso doar para receber a bênção impostos e culturalmente associados ao dízimo, na realidade diz respeito à alegria de doar com liberdade e consciência de ser um sinal de partilha. Trata-se de uma corresponsabilidade assumida por todos aqueles que creem e sobre a qual, historicamente, inúmeras cargas foram depositadas, como explica São Tomás de Aquino: “oferecer a Deus a décima parte dos próprios rendimentos não está na natureza das coisas, mas é um preceito judicial, uma determinação que pode ser mudada de acordo com as circunstâncias”.

Além disso, outra dificuldade encontra-se nos irmãos que não se sentem convidados à devolução do dízimo, seja pela dificuldade de evangelização, seja pela falta de noção de sua responsabilidade ou por acreditar que o dízimo não é capaz de gerar frutos profundos na comunidade. Todavia, só é possível perceber a existência de frutos quando se vive de fato a experiência comunitária, tornando a Igreja rica em generosidade. Não se trata de dar sobras, mas de partilhar, tampouco de se pensar em “comprar” a misericórdia ou até mesmo o próprio Deus pois “de graça recebestes, de graça deveis dar” (cf. Mt 10, 8). O convite a experiência concreta do dízimo é, sobretudo, uma ação evangelizadora na qual somos, ao mesmo tempo, agentes e alvos e divinamente inspirada: “Fazei a experiência, devolvei integralmente os vossos dízimos lá na casa sob ao qual habita o Meu nome e verei se não abrirei as compostas do céu e muito mais do que necessitai” (cf. Mi 3, 10).



Ândresson Aurélio Fernandes Martins

Acadêmico de graduação em Odontologia (UFPI)

 

Rita Francisca Fernandes Martins

Professora

Pastoral do Dízimo

 

Referências Bibliográficas:

AQUINO, Tomás de. Suma Teológica. v. I, parte I. 2ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 2001.

BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada – Edição Pastoral. Nova edição rev. e ampl. São Paulo: Paulus, 2002.

CNBB. Catecismo da Igreja Católica. 9. ed. São Paulo: Loyola, Paulinas, Ave Maria, Paulus; Petrópolis: Vozes. 934p.

CNBB. Comunidades de Comunidades – Uma nova paróquia. 1. ed. São Paulo: Paulinas, 2014. 58p. (DOCUMENTOS DA CNBB, 100).

CÓDIGO DE DIREITO CANÔNICO, promulgado por João Paulo II, Papa. Tradução Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Loyola, 2001.


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